06/06/2016

EU FUI ABUSADA. E AINDA SOU TODOS OS DIAS.



Essa noite eu sonhei que fui abusada. Estava sozinha, e três homens me abordaram. Começaram a passar suas mãos repugnantes em mim, e eu tentei me levantar, tentei fugir, porém me seguraram. Comecei a gritar e a pedir socorro, haviam muitos carros passando -o trânsito estava praticamente parado- mas ninguém parava, ninguém queria me ajudar. Ninguém se importava comigo. Acredito que estavam pensando que fosse uma briga de casal, e não queriam se meter. Afinal, em briga de marido e mulher, não se mete a colher, né? Que ditado mais ridículo! A mulher apanha, e ninguém mete a colher. Ninguém se mete. "Depois ela volta pra ele e a gente passa por ruim". É o que dizem. Mas naquela hora, eu não era a mulher. Eu era vítima. Eu nem os conhecia. E mesmo se os conhecesse, eles não tinham direito de me abusar daquela forma. Eu era indefesa. 

Eram três homens. Três. Um. Dois. Três. E eu uma. Uma. Uma só. Só. Sozinha. Não havia mais o que fazer. Chorar? Gritar? De nada adiantou, ninguém vinha a meu favor, ninguém vinha me socorrer. 

Me senti culpada. Eu estava no lugar errado, na hora errada, não é? Aquele bairro eu não deveria estar frequentando. Aquela rua estava muito escura (mesmo que foi em plena luz do dia). Uma moça não deve andar sozinha por aí. Minha calça jeans e meu moletom de menino estavam vulgares demais, né? Mulher direita não provoca. Se eu tivesse em casa isso não aconteceria. Eu deveria saber me defender. Eu deixei. Eu quis. Eu estava pedindo. Eu sempre desejei ser abusada. 

Será que eu preciso dizer um "só que não" ou dá para entender que mulher nenhuma pede isso? Que a gente é vítima, e não culpada? Que o estupro não se justifica em base nenhuma, quanto menos em roupa? Que nada é mais repugnante que um estuprador? Que eu sinceramente não acredito na prisão deles? Saem, e voltam a ser os mesmos psicopatas. Doentes. Que prazer em machucar em uma mulher? Forçá-la a algo? Isso para mim é o pior indivíduo de uma sociedade.

E nem foi só esse abuso. Eu também fui abusada por aquele meu tio que disse que "lugar de mulher é na cozinha". Fui abusada pelo meu pai, que não ajuda no serviço de casa porque "isso é coisa de mulher". Fui abusada pelo meu irmão que joga videogame enquanto eu limpo a casa. Abusada pelo meu vô que diz que "mulher não serve para nada". Abusada por aqueles que dizem que se eu fui traída, foi porque "meu marido não tinha em casa". Abusada por aqueles que dizem que a culpa é minha. Sempre minha.

E eu apenas sonhei com isso. Mas milhares de mulheres têm seus pesadelos realizados todos os dias. Atormentadas pelo resto da vida, com medo, com traumas que jamais serão superados. Mulheres que perderam sua infância, adolescência, seu namoro, casamento, talvez até perderam a sua vontade de viver. Quem sou eu para julgá-las? O trauma, as dores. Ninguém sente, somente elas. O que podemos fazer é nos compadecermos. 

Somos Maria, Beatriz, Inês, Lavínia, Letícia. Somos Isabela, Isadora, Luana. Somos Otávia, Flávia, Thabata. Somos todas elas. Somos todas as histórias delas. Somos as vidas delas. Ou de nenhuma delas. O fato é que somos mulheres. Eu, você. E NÓS merecemos ser RESPEITADAS. 

Baseado em fatos reais (e sim, eu ainda estou traumatizada com o sonho).

PS: Eu não me intitulo feminista. Eu não luto pelo direito das mulheres, não sou ativista. Estou apenas lutando pelo MEU direito. De não mais ter pesadelos com isso. De isso não me atormentar quando saio de casa à noite. De não viver com medo.

2 comentários:

  1. A partir do momento que você luta para que não tenha esse tipo de pesadelo, de maneira aberta como fez ao escrever isso, está lutando por outras mulheres também! :D
    www.dicasdamag.com.br

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    1. Sim, com certeza, mas tem outros princípios que o feminismo defende -e eu não sei-. Hehe obrigada por comentar! Um beijo lindona

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